Maior feira (livre de agrotóxicos) do Brasil desafia urgência da reforma agrária
- Sérgio Gadini
- 21 de mai.
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Atualizado: 21 de mai.
Uma praça de alimentação com opções variadas das diversas regiões e estados do Brasil, acessível ao custo equivalente de um prato feito diário, com sucos naturais, incluindo opções veganas e sem corantes artificiais. Frutas de todas estações, legumes, ervas preparadas para uso medicinal livre da química industrial. Uma oferta (a preços módicos ou gratuita) de plantas ornamentais, frutíferas e de paisagismo, ao lado de uma mostra de bioinsumos desenvolvidos em parceria com institutos e universidades públicas. Há poucos metros, outra variedade de laticínios, raízes, carnes, mel, café, derivados da cana e incontáveis frutas nativas regionais processadas por cooperativas e unidades familiares em pequenas propriedades. Prefere um vinho orgânico ou cachaça artesanal de qual estado?
Difícil descrever tudo o que a V Feira Nacional da Reforma Agrária, realizada no Parque da Água Branca, na capital paulista, entre 8 e 11 de maio, ofertou aos cerca de 300 mil visitantes que ainda tiveram a possibilidade de curtir gratuitamente opções de lazer, expressões culturais, shows musicais ou dialogar com grupos que experimentam em assentamentos de todo Brasil práticas egroecológicas e alimentos saudáveis produzidos em cultivo orgânico e sustentável da terra livre de qualquer risco de agrotóxicos.
No balanço dos organizadores da feira, promovida pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), foram 1.920 tipos de produtos ofertados, 40 toneladas de alimentos doados, participação de 180 cooperativas de produção e 143 pratos oriundos de 23 estados no espaço ‘Culinária da Terra’, apresentação de 357 artistas de múltiplas expressões culturais, além das 28 oficinas e seminários nos quatro dias do evento. A dimensão do projeto se traduz nos indicadores do evento: 580 toneladas de produtos, 12 mil mudas de árvores, 970 sementes, tudo com o trabalho de cerca de 2 mil trabalhadores rurais que vieram de todas as regiões do País, alguns grupos em viagens de dois ou três dias de duração.
Vale lembrar, aqui, que a distribuição das 12 mil mudas de plantas nativas integra a campanha do plano nacional do MST (“Plantar Árvores e Produzir Alimentos Saudáveis”) em garantir 100 milhões de árvores em 10 anos, até 2030, incluindo meio rural e áreas urbanas, onde se pretende reduzir os impactos da destruição ambiental de décadas no País.
É, sem dúvida, uma mostra do sucesso efetivo da reforma agrária, resultante de longas lutas sociais contra a pobreza e a desigualdade econômica no Brasil. A V Feira Nacional retoma uma iniciativa lançada em 2015, com edição a cada dois anos, mas interrompida pela pandemia, além de eventuais problemas criados por governos contrários aos projetos de inclusão social e economia solidária. O evento passou a integrar o calendário de eventos da cidade de São Paulo em 2019.
A próxima edição da feira já tem data: 2026. Não é preciso temer pela vida longa ao projeto, que destaca a necessidade de ver o Brasil plural, que ainda precisa reconhecer a força da pequena propriedade para alimentar a população, mantém a floresta em pé, defende os recursos naturais e reduz a desigualdade econômica pela aposta em políticas públicas focadas na solução de problemas sociais vivenciados pela maioria de pobres.
E é viável isso tudo? O sucesso da iniciativa confirma que, além de apoiar eventos similares, como faz o atual governo federal, é preciso urgência na implantação e garantia de políticas públicas em níveis locais, regionais e nacional, seja na desapropriação de áreas improdutivas para assentar famílias sem terra e trabalho, na garantia de incentivos à produção agrícola livre de veneno, além de integrar ações por condições de permanência e fortalecimento da pequena propriedade com programas educacionais e de saúde integrados, acesso ao crédito agrícola em juros economicamente viáveis para ampliar a oferta de serviços ao consumo sustentável, capazes de levar produtos sem veneno às escolas e bairros de cidades em todo o Brasil.
Experiências em andamento (não apenas no Brasil) confirmam que não basta promessa, mas é urgente acelerar iniciativas concretas por uma reforma agrária capaz de impulsionar o desenvolvimento sócioeconômico regional que reduz a desigualdade e pode acabar com a fome no País e no mundo. Bem-vindos/as ao século XXI, gestores públicos (eleitos) de todas as cores e grupos em funções nas diversas esferas da representação política da República. Um mercado sem veneno, ainda, é possível!
Sérgio Gadini, professor de Jornalismo na Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), Brasil

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