Dois caminhos
- Marcos Leite
- há 3 dias
- 2 min de leitura
E se de repente fosse possível descobrir que certas escolhas poderiam ter resultado numa vida diferente? E se então fosse possível viver uma vida a partir das escolhas que deixamos de fazer? Essa é a proposta de «A Biblioteca da Meia-Noite», bestseller de 2020, escrito pelo jornalista inglês Matt Haig e que foi tema do último debate do Clube de Leitura da Biblioteca da Universidade da Beira Interior.
O livro conta a história de Nora Seed, uma jovem inglesa que, de uma hora para outra, acaba envolta em uma série de pequenos acontecimentos negativos. Ao reconhecer a mediocridade de sua vida, Nora imagina na morte a solução de seus problemas. Não se trata de um instinto suicida, mas uma forma de dar um basta na sucessão de infortúnios, normais na vida de qualquer pessoa. Ao reconhecer sua incapacidade em dar um sentido para a vida, Nora acredita que a morte possa libertá-la de sua momentânea infelicidade.
É quando surge a biblioteca da meia-noite. Ao adentrar no espaço, Nora encontra a Sra. Elm, a bibliotecária que vai conduzí-la em uma jornada de autoconhecimento, tendo como ponto de partida o livro dos arrependimentos. A partir deste livro, cada arrependimento leva Nora Seed a conhecer outros livros que contam como seria sua vida se, em dada oportunidade, tivesse escolhido um outro caminho.
A narrativa é envolvente, embora o enredo seja juvenil e por vezes fantasioso. Mesmo assim, o autor consegue levar o leitor a caminhar com a protagonista nessa busca pelo autoconhecimento e valorização da vida para despertar o instinto de sobrevivência. Ao final, depois de experimentar como teriam sido as outras vidas, a partir das escolhas e arrependimentos, Nora escolhe aquela que teria sido a sua vida ideal. Porém, o final surpreende os leitores. A experiência compartilhada no livro conduz Nora a uma nova realidade, nada fantasiosa e tampouco surpreendente ou idealizada.
Ao leitor, especialmente do público juvenil, fica a mensagem de que a falta de experiência na vida pode levar as pessoas a situações de desesperança e ilusão, onde o isolamento social acaba por ser responsável por pensamentos de natureza contrária à vida. A viagem interior de Nora Seed mostra que uma vida aparentemente medíocre pode ser surpreendente e que a retirada dos arrependimentos nem sempre conduz ao ideal de vida sonhado.
A obra não deixa de ser uma visão sobre o tema do suicídio. Embora faça uso da fantasia para relatar o que se passa com a pessoa quando está prestes a morrer, trata o assunto com delicadeza, respeito e esperança. Sem prometer um final triste ou feliz, leva a protagonista – e os leitores – ao centro da própria existência: a vida. E por falar em vida, a de toda gente é assim, repleta de escolhas, arrependimentos e novas descobertas, porque há sempre dois caminhos a seguir e, em todos eles, há surpresas, boas ou más.
Marcos Leite, cronista.

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